Você já se perguntou se você é você mesmo?
Já se perguntou se você é algo além do que você olha pro
espelho?
Já se perguntou o que era antes de estar aqui?
Já se perguntou sobre o que será depois que essa vida
passar?
Como podemos ser tão pequenos e tão grandes ao mesmo tempo
quando nos vemos em relação a todo o funcionamento do universo?
Eu sempre fiz essas perguntas
Desde muito criança eu me perguntava e tentava lidar com a morte. Sobre o que aconteceria comigo depois disso tudo, sobre como seria depois que minha família fosse embora... ou se eu iria antes. Isso me perturbou por um bom tempo da minha vida. Tirou muitas noites de sono. E acredito que isso perturbou você também.
Pra começar, nada melhor que esse tema. Porque esse é um
dos pilares pra gente estudar na nossa longa caminhada. O espírito como parte
fundamental da nossa existência.
Falando um pouco da etimologia, a palavra espírito vem do latim spiritus, que significa respiração, ou sopro. Também pode significar vigor. Vocês reparam o tom de naturalidade desses significados? O espírito neste caso está ligado à vitalidade, é o ser que respira, que interage com o ambiente, que interage com sua natureza.
Na filosofia, achei bem interessante o conceito apresentado
por Aristóteles, que pra mim foi um dos maiores seres humanos que pisou neste
planeta. Aristóteles dizia que o espírito é o ordenador e a causa de todas as
coisas. E isso já me faz puxar na cabeça a primeira lei de Hermes Trismegisto:
o todo é mental. Isso quer dizer que antes de existir um princípio de
existência na matéria, existe uma ordem inteligente. Essa ordem inteligente
quer dizer o espírito? Não necessariamente
Platão marcava nosso mundo como o plano das coisas, mas acima disso ele afirmava a existência do plano das ideias. Que é outra ideia que dialoga com o hermetismo. Então a gente pode ver um princípio inteligente se desenhando nisso tudo, antes de nos manifestarmos como seres aqui na terra.
Do que a gente viu até agora trata a questão do espírito como algo que vem antes da matéria. Que vem antes do nosso mundo
Mais pra frente, já na era moderna, um filosofo chamado Immanuel Kant abordou o espírito se enveredando pra duas formas de conceito. Uma é a abordagem metafísica e diz que o espírito é uma substancia intelectual separável do corpo ou da matéria. Um pouco parecido com as ideias clássicas que a gente viu antes. A diferença é que o espírito nesse caso é tratado de uma forma mais funcional. Como algo de vitalidade...que dá vida ao ser...que dá vida a um objeto.
A outra forma de espírito que Kant abordava, já é bem mais aberta e tratava essa questão de uma forma mais reflexiva, como um ente de vontades de vivacidade na estética. Uma propriedade que permitia o ser refletir sobre as questões da beleza, da arte, dos sentimentos, da música, entre outras coisas. Me causando uma sensação de ser uma abordagem mais abstrata e humanista, que era um modismo daquela época. E era uma época que a civilização ocidental tentou se afastar das religiões, do poder da igreja, e se abrigou numa filosofia de vida mais material. E nessa filosofia não havia um depois da morte, não havia nada além da vida nesse plano. A vida é essa, o mundo é esse e deveríamos nos conformar com o fim. Como tudo na humanidade, ou é 8 ou 80. Ou a fé e a religião é a palavra final de um Deus misericordioso e onipotente, ou não existe nada e no fim você vira adubo pra um belo bosque.
Mas eu particularmente não penso assim.. Entre o preto e o branco existe uma escala infinita de cinza. E gosto de pensar nisso. Há vários degraus em uma escada que te leva do térreo ao andar de cima. Existem muitos dias nos calendários, muitos feriados santos e nacionais. Existem muitos níveis de humor entre o deprimido e o eufórico. Existe vários níveis da matéria até mudar de estado. Entreo zero e o um existem infinitas casas decimais... Enfim... Não sei se você entendeu minha analogia. Mas existem muitas variantes que tornam mais complexo e mais difícil enxergar com tanta certeza um objeto, um contexto, uma situação, uma ideia.
E o espiritismo, por Allan Kardec, vai abordar o espírito
como seres inteligentes da “criação” e que povoam o universo além deste mundo
material. Mas eles abordam o espírito como uma individualidade extracorpórea e
não apenas como o princípio inteligente do universo. Isso quer dizer que o
espírito já é um conceito distante daquele que a gente abordou na filosofia.
Não é mais a leitura fria, naturalista, abstrata do espírito como uma força
reflexiva que kant abordava. Ele agora é uma entidade inteligente e que habita
o universo, vive entre os mundos que lá na frente do texto do livro dos
espíritos, vai se mostrar com uma origem misteriosa, que nem os espíritos sabem
ao certo onde e quando surgiram. Mas a certeza está no fato de serem uma obra
de Deus, eterno e como princípio mental que precedeu toda a existência do
universo.
Outra visão interessante é a do hiduismo, que é a concepção
do Atman, que é o verdadeiro eu, que é eterno e parte indistinguível do deus
Brahma, um dos principais deuses da tradição hindu. Daí que o espírito passa de
encarnação em encarnação como forma de adquirir o grande aprendizado que é
entender que o seu Atman, o seu espírito, é idêntico ao Brahman. E assim pode
se libertar da encarnação e a prisão de desejos e sofrimentos da vida material.
O atman acaba por atingir o que eles chamam de Mosha, que quer dizer
libertação.
No capítulo 1, Kardec pergunta sobre o espírito ser imaterial e o espírito responde que imaterial não é bem o termo, mas incorpóreo. Eles diz que é a matéria quintessenciada, mas sem analogia para as nossas percepções. É tão etérea que escapa dos nossos sentidos.
Isso quer dizer que até certo ponto o espírito e o plano espiritual também operam na matéria mas em um estágio diferente, uma frequência que a gente não percebe. E isso nos escapa da nossa percepção porque as nossas limitações não permitem que a gente compreenda verdadeiramente do que são compostas todas as coisas desse plano, inclusive o espírito. E acabamos por chamar de energia, fluido cósmico universal, substancia etérea, mas isso escapa realmente do nosso entendimento. É como explicar a um cego sobre as cores, como ele deixa exemplificado no livro. Por isso é difícil entender e definir com tanta unanimidade sobre o que é o espírito. Tamanha é a dificuldade que as percepções são diferentes de uma cultura pra outra. E o legal é ver que mesmo assim, ainda há alguns pontos em comum entre elas que podem ajudar a gente nessa construção do entendimento.
É interessante ver que alguns desses conceitos se aproximam bastante, por mais que as barreiras de distancias geográficas, culturais e de linguagem distanciem os povos entre si. A filosofia nos deu a base do nosso entendimento sobre o que é o espírito, quando a gente entende que há um princípio inteligente por trás da nossa carne e que dá vida ao nosso corpo e todas as coisas que construímos são uma consequência das vontades do nosso espírito.
As doutrinas e culturas que tratam o espírito como um ente
próximo de deus e da perfeição do universo, me faz pensar: bom, eu estou
aqui... mas sinto que não sou daqui, não sou de lugar nenhum. E de alguma forma
a nossa evolução como consciência tende a nos aproximar de uma sutileza da vida
imaterial – me faz perceber que existe pelo menos um plano paralelo ou que
opera numa hierarquia superior de funcionamento do universo, talvez nem com as
mesmas leis que regem este plano que vivemos – enfim, isso deixa a gente se aproximar de uma perfeição que é o
funcionamento do universo pra além do que a gente pode enxergar e sentir, nos
aproximar de um ente superior a todos e eterno por natureza, sem explicação.
Nos aproxima da libertação e essa libertação é algo em comum em todas as
culturas, que é compreender as verdadeiras vontades, os verdadeiros desejos, é
chegar ao fim do medo, é o fim do sofrimento. Porque é a dor que faz a gente
entender que estamos vivos, e também o prazer. E se libertar é entender que não
precisamos mais disso. É jogar o prazer e o sofrimento pra fora da equação e
deixar a roda do Karma pra não precisar mais reencarnar.